Uma reportagem publicada nesta terça-feira, 29, em sua matéria de capa o jornal espanhol Marca revela que apostadores do tênis descobriram uma brecha no sistema online de pontuação utilizado pela ITF e têm usado isso a seu favor.
O fato de um espectador gritar "Olha! Te dou 5 mil euros de você perder o jogo com seu saque" a uma jogadora que disputava um torneio Future na região de Valdebernardo, na província de Madri, chamou a atenção da reportagem do jornal, pois nenhum dos presentes, nem mesmo as jogadoras, se constrangeram, ademais que 20 pessoas na arquibancada próximas ao que gritou riram do comentário.
A cena, de acordo com o jornal, cada vez mais recorrente em torneios nível, US$10 mil, Futures e Challengers, por todo o país ibérico tem um motivador. Os apostadores identificaram uma falha no sistema de 'Live Score' (resultados ao vivo).
Por regra da Federação Internacional de Tênis (ITF) todos os árbitros de cadeira são obrigados a registrar a pontuação da partida através de um PDA no instante após 'cantar' (dizer) o ponto em quadra. Isso dá um espaço de 20 ou 30 segundos para que pessoas e apostadores em todo o mundo tenham acesso àquela pontuação. A brecha é suficiente para que um apostador presente ao jogo modifique uma aposta, através do celular, e ganhe muito dinheiro com isso.
É importante ressaltar que a manobra não é ilegal.
O jornal trouxe um retrato de jovens entre 20 e 30 anos, que converteram o mundo das apostas como "seu modo de vida".
A reportagem conta ainda que como é necessário estar presente aos torneios para 'trapacear' contra a tecnologia, e por isto estes jovens viajam pelo país em grupos de 20 até 40 pessoas, autointituladas de "Seguidores do Circuito Feminino". Provenientes principalmente, de acordo com o Marca, de cidades como Zaragoza e Murcia. Os jovens são monitorados e orientados pelos donos de diferentes sites de apostas e também trabalham 'a favor' destas negociações aliciando jogadoras, que em sua maioria nestes torneios são muito jovens, para que elas ganhem dinheiro 'entregando' jogos contra prognósticos.
O jornal revela que as jovens que não cedem aos convites dos apostadores, vivem clima de medo nas quadras dos torneios em virtude de gritos que estes as direcionam em quadra com intuito de desconcentrá-las e alcançar seus objetivos. Com público pequeno, algumas acompanhadas apenas de familiares e/ou treinadores, as jovens tenistas sentem medo.
Pela lei espanhola, torneios realizados em parques e clubes públicos não podem retirar esse tipo de espectador das arquibancadas. Quando realizados em clubes particulares, os torneios tentam evitar a entrada destas pessoas.
Casos recorrentes, suborno e medo
Em uma segunda reportagem, o jornal traz o relato de que a ITF orienta os clubes a 'convidar' os apostadores que portassem celulares, tablets e outros dispositivos móveis a se retirarem das arquibancadas e que em junho isto ocorreu, mas que no dia seguinte os mesmos chegaram ao clube, que era particular, acompanhados da polícia local, que informou aos organizadores que a proibição de suas entradas só seria 'possível' com a comprovação de formação de cartel e/ou quadrilha de apostas.
Ao Marca, muitos dos que trabalham neste tipo de torneio e em clubes relataram que recebem e-mails, mensagens nas redes sociais com ameaças de morte como: "Imagina que se te acontece alguma coisa por não nos deixar entrar e sua família vai ficar preocupada".
As jovens jogadoras relatam, sem identificação, que recebem ligações de pessoas que se dizem jornalistas e conseguem informações sobre seu estado físico, lesões e até as aconselham a "não se esforçarem muito no próximo jogo para não correr riscos".
Subornar funcionários dos clubes e as atletas são o modo mais fácil encontrado pelo grupo de apostadores, descobriu a reportagem do jornal. “Se você me deixar entrar te damos 500 euros todos os que aqui estamos e seu chefe não saberá de nada", disse um dos apostadores ao empregado de um clube.
As atletas são abordadas nos hotéis e mesmo em quadra para vender seus jogos. " Apostas e coisas estranhas sempre existiram, mas nos últimos meses na Espanha tem se tornado insuportável por culpa destes apostadores", disse um treinador ao jornal espanhol.
Procuradas, as jogadoras preferem o silêncio, pois, "estão com medo", refere-se a reportagem.
Os fiscais da ITF são quem têm poder de ajudar a parar este esquema, pois precisam denunciá-los corriqueiramente à federação internacional. Entretanto, a pressão pode chegar até eles. Um profissional ouvido pelo Marca contou que já viajou de um torneio a outro no mesmo avião dos apostadores e os encontrou no torneio seguinte.